A volta do protecionismo

No seu último discurso sobre o estado da União, Biden anunciava a fim da lassitude na aplicação da protecionista “Buy American Act” de 1933. As suas palavras foram eloquentes ao respeito: “Esta noite também anúncio novas normas para exigir que todos os materiais de construção utilizados nos projetos federais de infraestruturas sejam fabricados nos Estados Unidos... Madeira, vidro, painéis de gesso e cabos de fibra ótica. E durante o meu mandato, as estradas, pontes e autoestradas estadunidenses se construirão com produtos estadunidenses também”. Inaugurava um giro protecionista mediante as leis de Redução da Inflação, de Chips e Ciência, e a de Infraestruturas, que priorizam a aquisição de matérias-primas e produtos com origem no país ou nos parceiros de tratados de livre comércio como Canadá ou México. A involução protecionista ameaça com provocar um impacto global difícil de mensurar. As autoridades comunitárias expressaram a sua preocupação acusando EUA de infringir as normas do comércio internacional e de atentar contra a livre competência. Até estão dispostas a reduzir a carga regulatória e permitir ajuda à indústria europeia para evitar a fuga de investimentos. A inovação como estímulo Na pugna polo domínio mundial, a inovação segue a ser o estímulo. Repto que influi nas cadeias de subministro e reforça o “soft-power” dum país, além de sustentar a sua capacidade económica e militar. A guerra comercial convencional mudou para a restrição do acesso a bens, serviços, recursos financeiros ou informação crítica. Daí que os EUA entravem as exportações tecnológicas a China para evitar que incorpore avanços estrangeiros no seu desenvolvimento industrial e militar. Aliás, o comércio internacional não é homogéneo. Há uma dicotomia entre economias centrais, com desenvolvimento endógeno, e periféricas, com um desenvolvimento induzido desde o exterior. Anwar Shaikh defende o carácter dualista das exportações dos países periféricos, caracterizadas por dispor de indústrias modernas controladas por capital estrangeiro junto a setores atrasados nos que predomina o capital autóctone. Em princípio, as exportações das primeiras melhoram a balança comercial enquanto aumentam as importações de capital e a expatriação dos lucros, dando-se um bloqueio do desenvolvimento das forças produtivas internas, destruição da indústria nativa e deslocamento de trabalhadores a setores modernos. A maior produtividade do setor estrangeiro distorce à baixa o preço das exportações, deteriorando a relação real de intercâmbio e a balança comercial, neutralizando o suposto efeito positivo do investimento forâneo e afetando negativamente a balança de pagamentos. Comercio exterior galego Sem soberania política e economicamente dependente, Galiza tem um papel subordinado na divisão internacional do trabalho. Com níveis de competitividade e de investimento em I+D médio-baixos, os baixos salários relativos tendem a compensar a menor produtividade e atrasam a modernização do aparato produtivo. O superavit comercial minguou em 2022. Foi 46% menor que o de 2021, e a taxa de cobertura foi de 110,35%, 15,3 pontos por debaixo da de 2021. Mesmo assim, continua a ser uma economia claramente exportadora. Segundo o Informe Anual de Comércio Exterior, em 2022 as exportações centram-se em manufaturas de consumo, concentradas no têxtil, em 26,2%, e no automóvel, em 19,4%. Juntos atingem uns 45,34% das vendas extraestatais. Mas o alto grau de concentração, setorial e empresarial da nossa capacidade exportadora supõe um alto risco para o futuro económico da Galiza. Além disso, uma parte considerável do nosso comércio exterior depende duma indústria moderna em mãos de capital estrangeiro, situação característica das economias periféricas com um desenvolvimento capitalista dependente de necessidades externas. Segundo as tábuas Input-Output de 2018, a produção interior galega achega 61% da oferta total de produtos industriais e a importação uns 39%. Da oferta industrial total, 43% destina-se a demanda intermédia e 40% à exportação. Curiosamente, o destino da importação é o setor industrial e o destino dos produzidos aqui, a exportação, característica predominante da reprodução capitalista nos países periféricos. Um maior desenvolvimento do nosso mercado interno permitiria consolidar a indústria com um mercado à sua disposição, impulsar economias de escala, melhorando a estrutura de custos, e aumentar o excedente, para depois dar o salto ao mercado mundial desde um sistema produtivo autocentrado em Galiza.