Asolagando baixo essa maré de tendenciosidades informativas, chegamos a dar por bom qualquer boia salva‑vidas que se nos atire desde a mesma nau que nos lançou à deriva. Até acreditamos na ilussão de um capitalismo de “rosto humano”, que renúncie a sua finalidade lucrativa e que permita conseguirmos a desaparição da pobreza e das desigualdades sociais. Grande erro. O celme do capitalismo é a acumulação continuada de capital. As crises são provocadas pela queda tendencial da taxa de lucro que paralisa o investimento produtivo, destrue emprego, desvaloriza a força de trabalho e impulsa um novo giro a porca da “austeridade”, que sempre sofrimos exclussivamente deste lado do cenário. Qualquer medida que ouse impugnar o roteiro de acumulação ampliada bate de frente com a própria lógica do capital. Daí as rebaixas e concesões dos modestos programas da socialdemocracia, que remata por desmovilizar à classe trabalhadora, quando accede ao poder político.
Desde os anos setenta do passado século diversas iniciativas financiadas por importantes grupos empresariais transnacionais recolheram e impulsaram as teorias hoje agrupadas baixo o que conhecemos como “neoliberalismo”. Promovem‑se think‑tanks, financiam‑se instituições do ensino universitário e publicam‑se numerosos informes e estudos que recomendam implementar as políticas económicas que interessam o capital e criticam o modelo do estado do bem‑estar funcional desde os anos quarenta. “Monetaristas” e “austriacos” são encumiados, tambêm no ámbito das universidades privadas mais prestigiosas, para assentar não apenas mais um paradigma económico, senão o único supostamente válido hoje.
O seu objetivo é a procura de novos espaços para obter mais‑valor reduzindo os custos laborais e minorando a despesa social. As privatizações e as reformas laboral e tributária tornam‑se em mecanismos que provocam o aumento da desigualdade social, uma distribuição mais regressiva da renda e aumentam o desemprego para presionar à baixa os salários.
Reforçam assim a função do estado como garante do processo de acumulação capitalista, embora erodam a sua própria legitimação assentada nas políticas sociais, e reduzem a economia a uma disciplina de gestão, técnico‑engenheril, profusamente formalizada em modelizações matemáticas de escasso valor preditivo, que não ressistem o mais mínimo contraste empírico. Condenam a economia a um papel meramente propagandístico e apologético das bondades da “liberdade” económica. Tencionam justificar sua ideologia através de equações.
Um verdadeiro asalto à mão armada
Os serviços públicos não são nenhum presente, derivam do apoderamento popular resuldado do confronto social de classe e constituem salário indireto na sua condição de serviços essenciais de oferta pública. Ante a queda da rendibilidade do capital na validação dos seus produtos e serviços nos mercados, é que são percurados novos cenários de valorização antes inexplorados. Os activos e serviços públicos básicos, para viver dignamente e compensar a exploração laboral, são alvo a alcançar pelos capitalistas. Um ataque amparado pelo controle burguês das próprias instituições do estado e legitimado baixo o guarda‑chuvas da superestrutura ideológica. Mais uma vez torna‑se patente a coerção do estado para avalizar o acrêscimo de capital: do combate ideológico à repressão frontal das actividades do movimento trabalhista. Um verdadeiro asalto à mão armada ao património de todas e todos.
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